quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Paraty 2006


Edson Bueno de Camargo


igreja um dia condenada a ruir
Nossa Senhora das Dores
vigia a baía de Paraty
com seus muros de pedra e branco caiado
posa para o pintor durante o dia

mais tarde a noite
o frio fazia
que me abraçasse
como querendo entrar em meu peito
e meus braços galhos grossos em tua cintura

o vento que raspava a superfície das ondas
vinha salgado e marinho em nossos lábios
ali na penumbra
éramos astrônomos persas
a tentar adivinhar os próximos anos

uma mulher ama a si mesma
no cimo no arrimo de pedra
em um canto escuro da praça
só somos despertados para sua presença
com os uivos de loba no cio
testemunho voyeur involuntário
quem sabe sua imaginação
nos colocou em um swing
do qual nunca saberemos
em nossa contemplação lunar

a lua
o motivo de estarmos lá
não só na praça
na cidade
na beira do rio
no poema

na cidade onde fiz quarenta anos
lobas uivam uma noite de orgasmos
nós
dois velhos amantes
esquecidos do medo
abraçados a observar o mar

os melhores dias de minha vida começaram

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