quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

modorra




Edson Bueno de Camargo

o sono
corcunda e torpe
(a tocar os sinos da catedral)
que vai crescendo na ponta dos dedos
em galhos secos e quebradiços
e se avoluma em tronco morto

ainda a modorra e o sonho
(das asas escalpeladas dos anjos
e quedas sangrentas)
e o mar de suor que invade
cada cavidade sem destino
a emular a febre
com sua química de mar ancestral

caminha sonâmbulo pelo mundo
do fazer de coisas e ofícios
cavar madeira para os pórticos do inferno
(a cata de palavras
o poeta a tomar a vida
do poema mudo
no pomar do Éden perdido)

não dão mais prazer o sal e o açúcar
o frio ou o calor
só o fitar sóis vermelhos
em tardes intermináveis de outono

a cada ano findo
a aproximação da aguda navalha
a contabilidade da morte

felizes os que morreram cedo
os poetas ainda jovens
os heróis
os tolos e os revolucionários
no tempo em que o espelho
ainda é só narciso
sem ter de aprender a inventariar a dor

Um comentário:

Anônimo disse...

Bem verdade... Maravilha, Edson!

Beijo.