terça-feira, 10 de setembro de 2013

Júlio Verne





Edson Bueno de Camargo


gosto muito de ouvir falar pessoas
que tem esta relação incestuosa
e indecorosa com o livro

que os lambem
cheiram
respiram o ar à sua volta
quase fazem sexo
com as palavras e as páginas

gosto muito de ouvir histórias
de bibliotecas assaltadas por piratas
de filhos pé ante pé
a capturar os livros de seus pais
na calada da noite

gosto de ouvir a palavra cetáceo
como se fosse uma confissão de infância
e me vem lágrimas nos olhos
de imaginar capas azuis
com detalhes dourados
(e minha confusão em pensar em Moby Dick)

gosto de ouvir uma pessoa
falar Júlio Verne
como se fosse uma oração
e de imaginar minha filha
nas paredes dos tempos
ainda criança
folheando meus livros de magia
que lhes haviam sidos veementemente proibidos

todas as palavras do mundo
soam-me infinitamente belas
que se somadas constituirão a estrutura
de uma biblioteca infinita
e sei
que um poeta argentino cego
espera-me à porta

( poema para o bate-papo com o escritor Flávio Mello na Biblioteca Municipal Cecília Meireles )