Edson Bueno de Camargo
I-
nunca lhe dei olhos
um: esquecimento
outro: a dúvida
II-
meu neto me fala numa língua incompreensível
as formigas carregam as pétalas
das rosas de agora a pouco
enxergo o passado pelo avesso
e o futuro como acontecido
a morte é doce como se afogar
ou ser enforcado pelos pés
os rios transbordam em pernas
lambem as coxas ao acaso
tentando alcançar o sexo
III-
os meninos carregam meu caixão
cantam alegres canções de ninar
(para alguns é visível que estão bêbedos)
de repente sou tão pequenino
um precoce sensível
em um esquife para passarinhos
IV-
os ratos correm em minha boca
os vermes passeiam em meu nariz
estatueta de cerâmica
o bule posto à mesa
para o chá da meia-noite
o infortúnio dos quase mortos
a terra come olhos como sobremesa
são doces e salgados ao mesmo tempo
e soltas suas luminescências no escuro
V-
secas vidas em corredores
resíduos de sangue
o cheiro acre de clorofórmio
formol em pequenas doses
resina de álcool e codeína
VI-
tuas unhas eram duras como a pedra
deste modo se converteu meu coração
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