quarta-feira, 16 de agosto de 2006

Unha de cachorra.

Edson Bueno de Camargo

para Lili Carabina

“ já não existo em alguns lugares”
Danilo Bueno


unha de cachorra
azulejo branco
sucumbe a trincas

embalagem vazia de mini cassete
abandonada sobre o móvel

mordida
ai!!

anta
tapir
anta
tapir

rato com fome
roendo o destino
rato com fome
roendo o disco do sol

anta tapir


tapete voador com traça
poeira de séculos escondida
traço trinca tapir

anta

ata

táta

tato

tapir


tudo esta contido em tudo.

Asa de xícara.

Edson Bueno de Camargo

1

orelha
de xícara asa
fino cristal porcelana

branca sobre a mesa
pequeno filete dourado

dourado o chá
o cheiro de erva doce
e bolo

perfume/manhã interrompido
chama e cigarro

2

cigarras cantam no jardim
sinfonia de cascas de arvore
bétulas e romãs
cinco anos sob a úmida terra
a pele antiga rompida/abandonada

nuvem de gafanhotos passam na janela

3

a terra/pedra cozinha no cadinho
metal incandescente e líquido
lavada com água tridestilada
a asa de corvo
alma luz polarizada

negro bloco de ébano
flor incrustada em pedra basáltica
gárgulas lanças de ferro/terra

fornos ardentes eternos
fogo contínuo
por mil anos queimando
almas e enxofre



4

água/ácido/sulfonados
destila nos beiros
água sulfúrica
sob chão de tábuas
pranchões lisos
chinelos de dedo pisam suaves

operários sem medo
percorrem alameda sem luz

5

por fim acordar assustado
para se perceber
ainda dentro do pesadelo

mosquito
zumbindo a noite
picando dentro da orelha

segunda-feira, 14 de agosto de 2006

PRÊMIO OFF FLIP DIVULGA VENCEDORES

PRÊMIO OFF FLIP DIVULGA VENCEDORES


Estão definidos os seis vencedores do I Prêmio OFF FLIP de Literatura. O Inscreveram-se quase 200 autores de todas as regiões do país e também do exterior, estando representados 15 estados brasileiros. O gênero escolhido este ano foi poesia e os textos versaram sobre o tema: TERRA. O Prêmio será anual e conta com o apoio da Secretaria de Turismo e Cultura de Paraty.

Os poemas inscritos na categoria nacional foram avaliados por escritores de expressão no cenário literário brasileiro: Braulio Tavares (RJ), Fausto Fawcett (RJ) e Micheliny Verunschk (SP). Os inscritos na categoria local foram avaliados por cinco pessoas de destaque no contexto artístico-cultural de Paraty: Diuner Mello, Irma Zambrotti, Maria José Rameck, Maritza Bonn e Zezito Freire.

Para Ovídio Poli Junior, diretor da programação literária da OFF FLIP 2006, o prêmio nasce como importante referência no meio literário em virtude da representatividade da comissão julgadora e da grande visibilidade que a FLIP e a OFF FLIP oferecem:

“Em 2007 o gênero será conto e temos a intenção de estender as inscrições aos países lusófonos e a autores de qualquer nacionalidade que escrevam em língua portuguesa. É importante que o prêmio se consolide junto à comunidade lusófona. Amplia-se a abrangência do prêmio e abrem-se caminhos para que mais autores tenham oportunidade de expor o seu trabalho em um encontro internacional dedicado à literatura como é a FLIP e como este ano passou a ser também a OFF FLIP, que teve entre seus convidados dois escritores estrangeiros - Faïza Guène e Uzodinma Iweala, este último também convidado da FLIP. Outros três escritores convidados pela FLIP também estiveram na programação da OFF FLIP 2006: Alberto da Costa e Silva (membro da ABL), André Laurentino e Marcelino Freire (vencedor do Prêmio Jabuti deste ano na categoria conto)”, afirmou.

Os três poemas vencedores em cada categoria estão reproduzidos logo abaixo e serão publicados em uma antologia comemorativa aos 40 anos da Editora Nova Fronteira. Os três autores premiados na categoria nacional foram contemplados com estadia gratuita em Paraty entre 9 e 13 de agosto e os dez poemas finalistas foram expostos na sede da OFF FLIP durante o evento. A classificação final foi divulgada no dia 12 de agosto no Villas de Paraty Pousada e o primeiro colocado em cada categoria recebeu um prêmio surpresa durante a cerimônia de premiação - uma caixa com 40 livros da “Coleção 40 clássicos”, editada pela Nova Fronteira. A Biblioteca Municipal Fabio Villaboim de Paraty também recebeu uma coleção completa. No dia 13 houve um almoço com os seis premiados no restaurante Ilha Rasa, situado na baía de Paraty.




OS 10 FINALISTAS DO I PRÊMIO OFF FLIP DE LITERATURA

FINALISTAS CATEGORIA NACIONAL




Nome do autor


Título do poema


Cidade


UF

1


Edson Bueno de Camargo


De um fragmento


Mauá


SP

2


Sérgio Bernardo


Ciclo


Nova Friburgo


RJ

3


José Carlos Mendes Brandão


Bueno Brandão, MG


Bauru


SP

4


Jorge Gonçalves de Oliveira Jr [Jorge de Barros]


Há rostos como se fossem calcanhares


Mauá


SP

5


Marcos Pamplona


A sombra na terra


Curitiba


PR

6


Luiz Carlos de Moura Azevedo


O tamanho das formigas


São Paulo


SP

7


Maria Eneida Soares Coaracy


Olho de ciclone


Brasília


DF

FINALISTAS CATEGORIA LOCAL




Nome do autor


Título do poema


Cidade


UF

1


Jacira Angélica Teixeira [Jacira Diniz]


Ciclo


Paraty


RJ

2


Jorge Adolfo da Silva Cypriano


Terra


Paraty


RJ

3


Marcos Irine


Cidade à toa


Paraty


SP





VENCEDORES CATEGORIA NACIONAL

Edson Bueno de Camargo nasceu em Santo André (SP) em 24 de julho de 1962 e sempre morou em Mauá (SP). Publicou O mapa do abismo e outros poemas (Edições Tigre Azul/FAC Mauá, 2006), Poemas do Século Passado - 1982-2000 (edição de autor, 2002) e Cortinas, com poesias suas e de Cecília A. Bedeschi (1981). Participou da antologia “As cidades cantam o Tamanduateí que passa” (editada pela Prefeitura do Município de Mauá) e também da coletânea Poesia Só Poesia (Editora Novas Letras). Junto com escritores e amigos da extinta Oficina Aberta da Palavra, grupo de Mauá-SP, edita o fanzine "Taba de Corumbê". Participa das oficinas da Escola Livre de Literatura de Santo André.

José Carlos Mendes Brandão nasceu em Dois Córregos (SP) em 28 de janeiro de 1947. Licenciou-se em Letras Vernáculas pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Sagrado Coração em Bauru (SP), cidade onde reside atualmente. Publicou quatro livros de poesia: O emparedado (1975), Exílio (1983), Presença da morte (1991); Poemas de amor (1999). Recebeu vários prêmios literários – como o “José Ermírio de Moraes” (promovido pelo Pen Centre de São Paulo) para melhor livro de poesia publicado em 1983-1984 e o da V Bienal Nestlé de Literatura Brasileira em 1991. Em 2000 recebeu o 1º lugar no Concurso Nacional de Literatura “Cidade de Belo Horizonte” (romance inédito). Tem inéditos três livros de poesia, um romance e um livro de contos.

Sérgio Bernardo nasceu no Rio de Janeiro em 30 de outubro de 1966. Jornalista e escritor, participa de academias de letras e associações culturais. Iniciou sua atividade literária em 1984. Recebeu prêmios no exterior (Portugal e Argentina) e no Brasil, como o Helena Kolody de Poesia e o Paulo Leminski de Contos. Tem textos publicados em antologias, jornais, revistas literárias e sites em vários países (Brasil, Portugal, Espanha e Suécia). Em Nova Friburgo (RJ), cidade onde mora, assina as colunas "Letra Livre" no jornal A Voz da Serra e "Expresso 2222" no jornal Alternativa. Colabora também nos jornais Folha do Catete (Rio de Janeiro) e Novo Tempo (Saquarema). Publicou em 2005 o livro Caverna dos signos (poemas e textos em prosa), patrocinado pela Secretaria de Cultura de Nova Friburgo.




VENCEDORES CATEGORIA LOCAL

Jacira Diniz nasceu em São Paulo e mora em Paraty há cerca de três anos. Escreve poesias esporadicamente e tem predileção em criar e contar histórias infanto-juvenis. Além disso, gosta de pintura. Agradece o incentivo de Gil Jorge, que também é poeta e a inseriu no mundo dos livros. Considera que a iniciativa da OFF FLIP em criar o Prêmio OFF FLIP de Literatura abre caminhos para que autores locais e de todo o Brasil mostrem seu trabalho literário. E isso justamente na semana em que as ruas da cidade são tomadas pela literatura.

Jorge Adolfo da Silva Cypriano é carioca e mora em Paraty desde 1983. Tem textos e poemas publicados no Jornal de Paraty e participou de várias antologias editadas no Rio de Janeiro pela Editora Clarear. Participou do Cabaré Literário na OFF FLIP 2005, realizado no Teatro Espaço, tendo sido um dos autores premiados. Um dos fundadores da APAE em Paraty, trabalha como técnico reabilitador e é pioneiro neste tipo de atendimento na cidade. Foi um dos participantes da FLEC – Festa Literária Escolar do CIEP, encontro entre escritores e estudantes realizado em Paraty em 2005.

Marcos Irine nasceu em Anápolis (GO) e vive em Paraty desde 2003. É cenógrafo e artista plástico. Em São Paulo trabalhou na Cenarium, especializando-se em cenografia para teatro e televisão e trabalhando com grandes nomes da dramaturgia brasileira. Colaborou na montagem cenográfica das peças “Além da linha d’água”, dirigida por Ivaldo Bertazo, e “O Evangelho segundo Jesus Cristo”, dirigida por J. C. Cerrone e baseada na obra de José Saramago. Realizou em 2002 sua primeira exposição: “Urbana”, mostra de arte contemporânea em que mostrou também sua habilidade de poeta. Essa mostra lhe rendeu dois prêmios e duas obras suas integram o acervo cultural do estado de São Paulo, estando expostas no museu do Parlamento Paulista no Palácio 9 de Julho.




Depoimentos sobre o Prêmio OFF FLIP de Literatura

“Um bom autor nunca escreve pensando em qualquer premiação. Escreve porque a obra assim o determina, porque a obra assim o exige. Não há, no momento de criação, qualquer ruído que não seja aquele das palavras que exigem o real. Entretanto, há algo de bem-vindo na instituição de um prêmio literário, que é a oportunidade de que um ou mais leitores descubram um poema, um texto em prosa ou mais, um autor por trás do escrito. Desse modo, por essa qualidade de desvelamento, saúdo a OFF FLIP pela instituição e primeira edição de seu prêmio literário, assim como todos os autores que se inscreveram. Encontrei poemas surpreendentes inclusive entre os que não foram classificados. Será uma alegria encontrá-los nas próximas páginas”.
Micheliny Verunschk – integrante da comissão julgadora nacional do I Prêmio OFF FLIP de Literatura.

“Acho que criação do Prêmio OFF FLIP de Literatura vem fortalecer o outro extremo de uma escala importante, que vai dos autores mais bem-sucedidos até os principiantes. Digo "bem-sucedidos" em vez de "ricos e famosos" porque creio que o sucesso, na Literatura, é encontrar leitores atentos e dispostos ao diálogo incessante com as nossas obras. O Prêmio pode dar, principalmente a autores jovens ou ainda não-publicados, a sensação de que por fim este diálogo está acontecendo. Não devemos supervalorizar a premiação em si, até porque se fosse outro o júri, ou outros os concorrentes, talvez o "nosso" poema tivesse outra sorte. Encontrar leitores, no entanto, faz parte dos acasos da vida, e uma das funções da poesia é garantir que nunca se abolirá o Acaso”.
Braulio Tavares – integrante da comissão julgadora nacional do I Prêmio OFF FLIP de Literatura.

“A criação do Prêmio vem estimular a participação de talentos literários nacionais e locais. Considero admirável a iniciativa do Prêmio OFF FLIP - que, acima de tudo, funciona como um elo entre o muitas vezes distante ou mesmo inatingível universo do mercado editorial e o mundo algumas vezes pequeno e marginalizado a que ficam restritos alguns escritores por razões e dificuldades diversas. Através do Prêmio e no contexto de confraternização do evento, ampliam-se as oportunidades de integração e visibilidade desses talentos, alguns ainda desconhecidos, junto ao meio literário”.
Marília van Boekel Cheola – assessora de imprensa da OFF FLIP 2006

“Sinto-me feliz por ter apostado na idéia do Prêmio OFF FLIP de Literatura e privilegiada por ter sido a catalisadora da concretização deste importante projeto, de Ovídio Poli Junior, que também é escritor e apresenta um programa a ser desenvolvido em longo prazo, rico em desdobramentos. A partir dele, a OFF passa a cumprir melhor o seu papel de evento literário. E com o apoio da Prefeitura Municipal de Paraty, abraçando a responsabilidade pela realização da OFF – que, afinal, representa a participação da cidade na FLIP -, o Prêmio OFF FLIP tem tudo para amadurecer e se tornar permanente.”
Lia Capovilla – coordenadora da OFF FLIP 2006




OS POEMAS VENCEDORES



de um fragmento

1_

de um fragmento de osso produzir a agulha
para costurar as palavras no céu da boca
e com cuidado arrancar as estrelas
que insistem em ficar entre os dentes

desfiar o lóbulo da orelha
com estilhaços de vidro
e urdir uma escuta refinada com aço cirúrgico e ouro

2_

descobrir que a palavra desejo
não se agrega com pouco barro
e produzir o estrondo secular
das pernas traseiras dos grilos

colocar dois dedos na vagina
úmida e quente
e testar a temperatura das fogueiras
que queimaram o dom e o prazer do ser feminino

que ser homem é carregar a aspiração
de sempre retornar a úteros escuros
descer as mais profundas fendas e cavernas
e que morrer é se vestir de terra
para que uma mãe telúrica venha nos afagar os cabelos

3_

olha como choram os meninos apartados
como colam os dedos e arrancam a pele sem meditação
que arranham o couro do peito
feridos de tanto sal e sol

e retalham o horizonte com tesouras sensatas
e puxam fio a fio produzindo um novelo
recosendo o céu com agulhas de ossos humanos

Edson Bueno de Camargo
(Mauá – SP)


Fonte: http://www.paraty.com/offflip2006/index2.htm

segunda-feira, 7 de agosto de 2006

Anespirais.

Edson Bueno de Camargo

espirais cobrem meu corpo
despencam helicoidais
ideogramas/nanquim/pincéis
tatuagens
não breves sinais

rufar de tambores
febre cerebral/enxaquecas
furor
humor e tumor
dores fatais

não sei quanto tempo
sentado na praça
contando cachaça
bebendo desgraça

sem você
sou vazio e sem cenho
criança sem colo da mãe

me lembro quando amar
não doía
pérola na língua
vermelho carmim

agora carrego um olhar flutuante
choro lendo hai-kais

chuva sobre bambuais

tensão de garoa
uma lata vazia flutua no ar

um dia ouvi alguém que esqueci
sussurrou

em japonês
amor
se diz – ai –

Espinhos/arames.

Edson Bueno de Camargo

1

haviam
tantos/todos
daqueles meninos
com luzes nos olhos

flores de laranjeiras
espinhos/arames farpados

muitos não tinham
para onde ir

outros menos pudicos
eram ali mesmo

era incenso
mirra e mel
carnaval/canavial

outros não

2

tudo
imaculadamente limpo
impiedosamente branco

outro arame
das cercas
cercanias anunciadas

água e sangue
tinto o linho/cânhamo/algodão

cheiro de álcool e éter

3

cheiro de terra
úmida
urina

balõezinhos
outrora noite
luzes de inverno