Edson Bueno de Camargo
1_
preso a guelra do peixe
onde o azul é mais lento
esforço-me para respirar
tanto fundo como turvo
toda água dos pulmões
será a memória
que não se desapega
quem nos atraiçoa
tentar respirar líquido
quando tudo que nos resta é ar
2_
a fauna de minha narina esquerda
morre a todo amanhecer
quando se avermelha o ferro
e borbulha a água
e os velhos se vestem de luto
tragam a dor
e cospem no chão
para me escarnecer
3_
reconheço ainda mais este meu erro
um jorro de paixão impoluta
todo o pecado de um lençol
4_
Eros e Tânatos
são irmão de sangue
compartilham o mesmo pai
um dia
quando menos se espera
um matará o outro
afogados no lago do jardim
(narcisos, observam com certo receio)
neste dia se servirá um banquete
quando aos pés dos convivas
se servirá a minha carne
5_
Caim matou em Abel
aquilo que mais amara
não suportou ter de ter ciúmes de seu Deus
(depois fundou a civilização
a cidade de nome de seu filho)
também não O tenho suportado
assim como
Lúcifer traiu Deus por ciúmes
traiu Judas
a Cristo
sempre por amor
se matou e se deixou matar
e assim será por séculos e séculos
6_
que vale desengonçado
tenho por ver
em minha frente
morrerei mais um pouco hoje
mais do que ontem
o resto será por amanhã
a voz de teus filhos
nunca será a tua voz
pássaros que deixam o ninho
o fazem para não mais voltar
7_
as trombetas que
derrubaram as muralhas de Jericó
agora soam em meus ouvidos
hoje visto os fiapos
daqueles panos que me cobriram o corpo
corvos voam em círculos
por meu novo jardim
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